Olá, vaquinhas!
Último dia do mês e cá estamos!
Aproveitem a leitura,
Cassimila e Sarah
VACA PROFANA
Quando eu era criança, Dolores Gonçalves da Costa, a Dercy Gonçalves, já era um ícone, um patrimônio da televisão brasileira. Eu nunca soube muito bem o que a Dercy era. Como atriz, ainda muito criança, lembro dela na novela Deus nos Acuda. Não sei explicar como, mas ela sempre esteve ali entre os famosos brasileiros que me fascinavam. Ela, para mim, era uma espécie de “pessoa proibidona” da TV. Quase como um funk proibidão. Desbocada, mostrando o corpo, falando a sua verdade. Que sabor era poder ouvir, quase que às escondidas, aquela senhora que desfilava com os peitos de fora no Carnaval. Lá em casa, reviraram os olhos quando ela aparecia. Dercy morreu com 101 anos. Ela foi importantíssima para o quadro de mulheres artistas do Brasil, começando a vida nos palcos aos 16 anos, fugindo com o circo. Nos anos 30, já figurava nos teatros como atriz de comédia e estreia no cinema na década seguinte. Sua vida profissional também era bastante movimentada nos bastidores, onde chegou a assumir a produção de vários espetáculos que foram sucesso no país. Dercy abriu portas sem se importar com o que pensavam dela. Hoje, lendo as suas entrevistas, fico pensando: de que lado estaria ela hoje em dia? Ela dizia que se casou por conveniência, que nunca foi ligada em sexo, que homem dava trabalho e ao mesmo tempo não acreditava em feminismo e era homofóbica. Quem vive mais de um século pode ser tudo? Existe licença poética para poder ser tantas contradições quando se vive mais de cem anos? E tudo isso, sempre muito consciente da sua importância para a arte brasileira. Deixo com você, a entrevista de 2002 no “De frente com Gabi”, que me tirou boas gargalhadas. Dercy, vestida com regata do Brasil e prestes a posar nua aos 95 anos. Um deleite! (SM)
Foto de Andrea Farias Farias
PARA QUEM VOCÊ SE VESTE?
Dizem que a mulher se veste para outra mulher. Tem quem diz, que devemos nos vestir para nós mesmos. E tem uma “trend” incrível no TikTok que são as mulheres deixando de ser “bonitas na visão masculina” e abandonando algumas características que são consideradas “sexies” pelo sexo oposto e adotando uma aparência mais natural, com roupas mais confortáveis e muita autenticidade. Se o algoritmo ainda não te entregou essa transformação, dá uma olhadinha nos vídeos aqui. (SM)
OS HOMENS AO SEU REDOR LEEM LIVROS DE FICÇÃO?
Esse mês, essa nota aqui me chamou atenção: a grande maioria dos homens heterossexuais não lê livros de ficção. Isso acontece na sua bolha? A matéria diz que eles preferem um livro de autoajuda ou de negócios ao invés de um bom romance. Parece que, para alguns, ler por prazer é “perda de tempo”. Usualmente, os homens preferem algo que possam usar para ganhar dinheiro ou impressionar os amigos (ou o próximo date).
Essa visão de que tudo precisa ser “produtivo” faz parte de uma cultura que impõe que homens sejam máquinas de eficiência. Influenciadores de masculinidade, dos quais não vou nem falar aqui para não dar palco - promovem essa ideia de que, para ser “sigma”, você precisa estar sempre se aprimorando. E é aí que a ficção -não- entra.
Eu não preciso afirmar aqui que essa interpretação é mais uma imposição da tal da masculinidade tóxica. Ler ficção pode ser extremamente benéfico e eu e você sabemos disso, certo? É uma pausa merecida no meio da correria do dia a dia e pode até ajudar a diminuir o estresse, aumentar a empatia e proporcionar uma boa dose de diversão! Não vamos generalizar, óbvio. Existem, sim, aqueles que leem de tudo. Mas, os números da matéria sobre o domínio feminino por essa preferência editorial me fazem pensar se isso não esteja limando um pouquinho a imaginação daquele hétero que te propõe um date na casa dele, sem muita necessidade de conversa ou de sugerir alguma coisa diferente, sabe? Queria ouvir a opinião das nossas feganistas, sobre isso. E aí? O que acha? (SM)
FEIJÃO CARIOCA?
Sarah e eu somos paulistas, terra onde o feijão do dia a dia é o carioca. Mas vejam só, no Rio de Janeiro, se você pedir feijão, não é o “carioca” que vai aparecer no seu prato, e sim o feijão preto, o feijão básico do dia a dia dos cariocas. O feijão carioca é na verdade paulista de Palmital e é o feijão mais consumido do país. Surgiu em 1970, fruto de uma mutação espontânea que um produtor identificou que era muito produtiva e resistente. O nome foi dado pela tonalidade e marcas no feijão que lembravam um porco caipira conhecido como porco carioca.
Será que o porco carioca era realmente carioca? Não encontrei essa informação. Pensei que os porcos nos anos 70 eram outros e deviam viver em outras condições, nenhuma delas eu julgo aceitável, mas por uma breve pesquisa no google passei por imagens de criação de porcos atuais, muito tecnológicas, impressionantes imagens que não podemos normalizar.
Fica aqui a dica de como fazer feijão sem animais - pessoas que não acertam o feijão, chegou a hora. (CE)
TEM QUE LER
“Temos a mente aberta em relação a muitas coisas, mas não aceitaremos não vegetarianas ou mulheres de cabelo curto.”
A protagonista Nikki lê o recado acima (entre vários outros) no mural de casamentos de um templo Sikh. Filha de imigrantes indianos, Nikki mora em Londres e desafia muitas tradições, mas chega até o templo Sikh por um pedido de sua irmã Mindi, que realmente deseja um casamento arranjado tradicional. Ali naquele mural, na parte de trabalhos, Nikki acaba se interessando por uma vaga para professora de escrita e é lá que se desenrola o título do livro.
O delicioso livro Escola de Contos Eróticos para Viúvas foi escrito por Balli Kaur Jaswal, escritora nascida em Singapura, de família do estado de Punjab, na Índia. Essas senhoras e viúvas indianas vão derreter o seu coração, eu prometo. É um livro de leitura fácil, com temas bem feministas, dramas fortes sem perder a ternura. Recomendo demais. (CE)
"— Por que estão usando nomes de vegetais e frutas? — Nikki interrompeu. Aquelas conversas estavam lhe tirando a vontade de ir ao supermercado.
— Nem sempre usamos — Manjeet disse. — Às vezes dizemos danda. — Era a palavra em punjabi para “vareta”. — Ninguém fala sobre essas coisas. Todo nosso conhecimento e linguagem foram passados por nossos pais. E eles certamente não discutiam o que homens e mulheres faziam juntos.
(...)
— Certo, então — Nikki disse. — Podemos manter os nomes de vegetais, se é o que as deixa mais confortáveis.
— Vegetais são os melhores — declarou Preetam. — Diga, tem algo que passa melhor a ideia da sensação e do sabor do que descrever aquilo como uma berinjela bem suculenta?"
QUAL SEU MODO DE LUTAR?
O Acampamento Terra Livre é a maior Assembleia dos Povos e Organizações Indígenas do Brasil e acontece desde 2004. Nesse curta-metragem de 15 minutos, Francy Baniwa, Kerexu Martim e Vanuzia Pataxó, cineastas indígenas, trazem uma perspectiva das mulheres nessa mobilização. Especialmente me impactou sentir e absorver a reflexão sobre o modo de lutar que dá nome ao filme.
Lembrei desse cartaz chamado A luta, da Santarosa Barreto, que ganhei de uma amiga muito querida e estava presente na exposição Histórias das mulheres, histórias feministas no MASP. Como você luta? (CE)